Augusto Elias da Silva

Elias da Silva reencarnou na terra portuguesa em 1848[1], justamente no ano em que uma onda de renovação espiritual, como fogo em palha seca, se irradiaria de Hydesville para o mundo todo.

Estava ele destinado, qual aconteceu a inúmeros ilustres compatriotas do outro lado do Atlântico, a grandiosos empreendimentos na terra irmã brasileira. Para aqui se transportavam intuitivamente, ou levados pelo misterioso acaso, a fim de atenderem às solicitações da Espiritualidade.

Assim, veio para o Brasil, desembarcando na Guanabara em data que não nos foi possível descobrir, o humilde fotógrafo profissional Augusto Elias da Silva, que consigo trazia um coração generoso e simples, e um cérebro esclarecido, resoluto e empreendedor.

Ismael lhe reservava, nestas paragens brasileiras, alta missão, pelo saber capaz de levá-la a bom termo, com denodo e perseverança.

Quanto às razões que conduziram Elias a aderir aos princípios espiritistas, transcreveremos a seguir as suas palavras textuais, publicadas em “Reformador “ de 1-9-1891, e que dizem o que a respeito conseguiríamos saber:

“Em 1881, fui convidado a assistir a uma sessão na sala da Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e Caridade, à rua da Alfândega n.º 120. As minhas convicções nesta época eram as do mais lato indiferentismo religioso, não tendo a menor parcela de dúvida sobre a não existência da alma. Não admitindo os fenômenos das diversas religiões, só via nelas agrupamentos de ociosos e amigos de dominar, explorando a ignorância das massas, geralmente supersticiosas e inclinadas ao sobrenatural.

Foi-me aconselhado a leitura das obras do imortal Kardec. Pela leitura, despertou-se-me o desejo de verificar experimentalmente as teorias que ia bebendo, e comecei a freqüentar as sessões dos grupos e sociedades então existentes, onde gradativamente fui recebendo as provas mais robustas da manifestação dos que eu chamava mortos”.

Estudando com ardor as obras de Kardec e todas as demais que adquiria para aumentar seus conhecimentos acerca da Doutrina que lhe abrira um mundo de luminosas e até então veladas verdades, em pouco tempo Elias traduzia seu entusiasmo e sua vontade de servir à Causa, tornando-se ativo membro da Comissão Confraternizadora da Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e Caridade. Fundou, a seguir, o “Grupo Espírita Menezes “, nome dado em homenagem a Antônio Carlos de Mendonça Furtado de Menezes, que fora diretor da Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e Caridade, e cujo bondoso Espírito, desencarnado em 11 de Dezembro de 1879, dirigia então os trabalhos do referido Grupo. Esta Sociedade muitos benefícios espalhou, e em 1885 fundiu-se à Federação Espírita Brasileira, para a qual se transferiram os seus sócios.

Fundar e conservar um órgão de propaganda espírita, na Corte do Brasil, era, naquela época, de forma a entibiar o ânimo dos espíritas mais resolutos. Todas as baterias do Catolicismo estavam assestadas contra o Espiritismo. Dos púlpitos brasileiros, principalmente dos da Capital, choviam anátemas sobre os espíritas, os novos hereges que cumpria abater. Datada de 15 de Junho de 1882, fora distribuída ao Episcopado brasileiro uma Pastoral do Bispo da Diocese de S. Sebastião do Rio de Janeiro, na qual o Antigo Testamento era astuciosamente citado para contraditar as comunicações mediúnicas, e tão anticristão e violento era o zelo daquele prelado, que com naturalidade escreveu, referindo-se aos espíritas: “Devemos odiar por dever de consciência”.

Amparado e incentivado dentro do lar por duas almas boas e valorosas, sua sogra, D. Maria Baldina da Conceição Batista e sua esposa, D. Matilde Elias da Silva, de quem teve um filho também chamado Augusto, ambas espíritas convictas, Elias lançou o REFORMADOR em 21 de Janeiro de 1883[2], com os recursos tirados do seu próprio bolso, situando a redação e oficinas em seu atelier fotográfico à então rua da Carioca, 120 – 2º andar (ex-São Francisco de Assis) onde também residia com sua família.

Até 1º de Fevereiro de 1888, “Reformador “ teve sua secretaria e tesouraria à rua da Carioca, 120, 2º andar, no local de residência e trabalho de Elias. Havendo, por essa época, necessidade de mais espaço para o desenvolvimento daquela publicação, a Diretoria resolveu instalar a seção do “Reformador “no prédio n.º 17 ( depois n.º 25 ) da então rua do Clube Ginástico, hoje Silva Jardim, para onde também se transferiu a Federação Espírita Brasileira, que se achava à rua do Hospício ( hoje Buenos Aires), n.º 102.

Em 27 de Dezembro de 1883[3] aquele infatigável lidador reuniu em sua residência, como sempre o fazia semanalmente, os companheiros que mais de perto o auxiliavam no “Reformador”. Eram doze individualidades ao todo, um quarto das quais pertencia ao sexo feminino, “como a indicar” - conforme escreveu o saudoso Dr. Guillon Ribeiro - “quão importante viria a ser a parte que caberia à mulher na obra, que então se encetava, de evangelização”.

Nessa memorável noite de 27, firmava-se entre os presentes o ideal de fundar-se uma Sociedade nova, que federasse todos os Grupos através de “um programa equilibrado ou misto” e que difundisse por todos os meios o Espiritismo, principalmente pela imprensa e pelo livro.

No primeiro dia de Janeiro de 1884, uma terça-feira, reunidos na residência de Elias da Silva (rua da Carioca, 120, 2º andar) alguns espíritas de fé e arrojo, entre os quais além da sogra e da esposa do chefe da casa, os Srs. Francisco Raimundo Ewerton Quadros, Manuel Fernandes Figueira, Francisco Antônio Xavier Pinheiro, João Francisco da Silveira Pinto, Romualdo Nunes Vitório, Pedro da Nóbrega, José Agostinho Marques Porto, era definitivamente instalada a FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA .

No princípio, as reuniões ordinárias da Diretoria, às quais compareciam também alguns sócios fundadores mais chegados à Sociedade, realizavam-se na residência de Elias, e só a partir de 17 de Dezembro de 1886 passaram a ser efetuadas na casa de Santos Moreira, numa sala gentilmente por ele cedida, já que Elias estava prestes a ausentar-se da Corte. Ainda por esse motivo é que Elias, reeleito para o cargo de tesoureiro em 2-1-1885 e 5-1-1886, pedia aos amigos, em fins de 1886, não o incluíssem na chapa para a eleição da nova Diretoria de 1887. Foi então substituído nas funções da Tesouraria pelo seu velho companheiro F. A. Xavier Pinheiro, mas o “Reformador “ continuou ainda à rua da Carioca, 120. O nome de Elias, que mui raramente deixava de figurar nas Atas das sessões, não mais apareceu depois de 31 de Dezembro de 1886.

Retornando ao Rio de Janeiro, Elias volta a ocupar o cargo de tesoureiro, nas eleições de 2-3-1888. Foi este o último ano em que exerceu funções diretas na Diretoria, por sua própria deliberação. Mas isto não impediu que ele continuasse a freqüentar as sessões da FEB, ombro a ombro com os antigos companheiros de lides doutrinárias, com eles estudando um sem número de questões e problemas relacionados a pontos de Doutrina e à orientação geral do Espiritismo em nossa terra , além do que propagava da tribuna os princípios espiríticos. Pode-se dizer que, quase até ao fim da vida terrena de Elias, a Federação Espírita Brasileira foi para ele o seu segundo lar, lar a que dedicou todo o seu amor e trabalho Elias residia ainda naquela mesma casa ( agora sob o n.º 114) em que fora fundada a Federação. Minado o seu organismo pela tuberculose pulmonar[4], aguardava ele sobre uma cama a hora em que passaria desta vida.

No dia 18 de Dezembro de 1903 cessaram, afinal, os derradeiros esforços vitais do conceituado fotógrafo.

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[1] Segundo a Guia de óbito da Santa Casa da Misericórdia e o Livro de Registro do Cemitério de S, Francisco Xavier, Elias faleceu aos 55 anos deidade, o que dá para o seu nascimento o ano de 1848.

[2] Nesta mesma data desencarnava, em Paris, a professora Amélia Boudet, viúva do grande missionário Allan Kardec.

[3] “Reformador”de 1924, pág. 497

[4] Foi a causa do falecimento, segundo a Guia de óbito da Santa Casa da Misericórdia